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versión impresa ISSN 0378-1844

INCI v.32 n.4 Caracas abr. 2007

 

ANÁLISE DO LÍQUEN Cladonia verticillaris (Raddi) Fr., EM CONDIÇÕES DE LABORATÓRIO SOB EFEITO DO ESTIRENO E CICLOHEXANO

Fernanda Maria de Oliveira Villarouco, Erika Viviane Correia Freire, Eugênia Cristina Gonçalves Pereira e Roberto Enrique Urrutia Pérez

Fernanda Maria de Oliveira Villarouco. Licenciatura em Ciencias, Fundação de Ensino Superior de Olinda, Brasil. Aluna do Doutorado em Ciências Ambientais, Centro EULA, Universidad de Concepción, Chile. Docente, Departamento de Anatomia, Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Brasil. Endereço: Centro de Ciências Biológicas, UFPE. Av. Prof. Morães Rego s/n Cidade Universitária Recife, PE, Brasil. e-mail: fvillarouco@gmail.com

Erika Viviane Correia Freire. Licenciatura em Biologia, UFPE. Especialista em Ecologia e Meio Ambiente, Faculdade Franssinetti, Recife, Brasil.

Eugênia Cristina Gonçalves Pereira. Mestre em Criptógamos e Doutora em Botânica, UFPE, Brasil. Docente, Departamento de Ciências Geográficas, UFPE, Brasil.

Roberto Enrique Urrutia Pérez. Licenciatura em Biologia e Doutor em Ciências Ambientais, Universidad de Concepción (UC), Chile. Docente, UC, Chile.

RESUMO

Cladonia verticillaris (Raddi) Fr. coletada em solos arenosos no município de Alhandra, Paraíba, foi submetida, sob condições de laboratório, a aplicação de 4ml de estireno, ciclohexano e água deionizada. Extratos orgânicos de amostras com 3, 5, 10 e 15 dias, foram analisados em ensaios de cromatografia de camada delgada (CCD) e cromatografia líquida de alta eficiência (CLAE). Estas amostras foram também analisadas em microscopia eletrônica de varredura (MEV) para análise de alterações morfológicas. Os resultados evidenciaram a produção de algumas substâncias intermediárias e redução do ácido fumarprotocetrárico e atranorina. A análise da superfície externa do líquen demonstrou alterações morfológicas com exibição das hifas corticais. Este estudo ratifica os dados obtidos no ambiente, e caracteriza o potencial de C. verticillaris como bioindicador imediato para poluição atmosférica.

ANALYSIS OF THE LICHEN Cladonia verticillaris (RADDI) FR., IN LABORATORY CONDITIONS UNDER STYRENE AND CICLOHEXANE EFFECT

SUMMARY

Cladonia verticillaris (Raddi) Fr. collected on sandy soils of Alhandra municipality, Paraíba, Brazil, was submitted, under laboratory conditions, to sprays of 4ml of styren, ciclohexane and deionized water. Organic extracts of samples with 3, 5, 10 and 15 days, were analyzed by high performance liquid chromatography (HPLC), and thin layer chromatography (TLC). Samples were also analyzed by scanning electron microscopy (SEM) for the observation of morphological damage. The results evidenced the production of some of the intermediary substances and reduction of the fumaroprotocetraric acid and atranotin. The analysis of the external surface of the lichen showed morphological alterations and appearance of cortical hiphae. This study ratifies data obtained in the environment and characterized the potential of C. verticillaris as a rapid bioindicator of air pollution.

ANÁLISIS DEL LIQUEN Cladonia verticillaris (RADDI) FR., EN CONDICIONES DE LABORATORIO BAJO EFECTO DEL ESTIRENO Y CICLOHEXANO

RESUMEN

Cladonia verticillaris (Raddi) Fr. colectada en suelos arenosos en el municipio de Alhandra, Paraíba, fue sometida, bajo condiciones de laboratorio, a la aplicación de 4ml de estireno, ciclohexano y agua desionizada. Estratos orgánicos de muestras con 3, 5, 10 y 15 días, fueron analizados en ensayos de cromatografía en capa delgada (CCD) y cromatografía líquida de alta eficiencia (CLAE). Estas muestras fueron también analizadas por microscopía electrónica de barrido (MEB) para análisis de alteraciones morfológicas. Los resultados evidenciaron la producción de algunas sustancias intermediarias y reducción del ácido fumarprotocetrárico y atranorina. El análisis de la superficie externa del liquen demostró alteraciones morfológicas con exhibición de las hifas corticales. Este estudio ratifica los datos obtenidos en el ambiente, y caracteriza el potencial de C. Verticillaris como bioindicador inmediato para polución atmosférica.

PALAVRAS CHAVE / Bioindicador / Ciclohexano / Cladonia verticillaris / Estireno / Líquen /

Recebido: 20/07/2006. Modificado: 18/01/2007. Aceito: 23/01/2007.

Introdução

Os liquens resultam de uma simbiose entre um fungo (micobionte) e uma ou mais algas (fotobionte), que resultam em um talo de estrutura estável (Hale, 1983; Nash, 1996). Sendo organismos simbióticos excepcionais, são encontrados em todas as regiões do mundo, geralmente, em áreas submetidas a condições climáticas severas. Apresenta-se sensível à poluição atmosférica (Pilegaard, 1978; Seaward, 1993), sendo utilizados como bioindicadores por não dependerem de um sistema radicular para absorção de nutrientes, e ainda por possuírem cutícula reduzida ou ausente, incorporando com facilidade poluentes dispersos no ar (Pilegaard, 1978). Por terem alimentação higroscópica, os líquens, fixam elementos presentes na atmosfera, desta forma a pureza do ar atmosférico é essencial à sua sobrevivência. Estes seres absorvem e retém elementos radioativos, íons metálicos, dentre outros poluentes, o que faz com que sejam utilizados como indicadores e/ou monitores biológicos de poluição atmosférica (Nieboer et al., 1972; Freitas et al., 2000; Loppi e Bonini, 2000; Loppi, 2001). Devido à rapidez de resposta que apresentam, podem ser classificados como bioindicadores imediatos de contaminação (Hawksworth et al., 2005).

O biomonitoramento pode ser definido como um método experimental indireto de verificação da existência de contaminantes em uma certa área. Se basea na utilização de organismos vivos, que respondem ao estress, uma vez que se encontram submetidos a modificações nos ciclos vitais ou pela acumulação de contaminantes (Wappelhorst et al., 2000; Carreras e Pignata, 2001). Estes organismos são normalmente denominados bioindicadores, quando reacionam ao estress pela acumulação de substâncias nos tecidos, são reconhecidos como organismos resistentes e denominados bioindicadores de acumulação. Quando sofrem alterações morfológicas, fisiológicas, genéticas e etológicas são considerados organismos sensíveis e denominados bioindicadores de reação (Nimis et al., 2000; Klumpp et al., 2001; Wolterbeek, 2002).

A utilização de biomonitores passivos, existentes na área de estudo, ou ativos, transplantados de pontos com baixo ou nenhum teor de poluentes, tem sido relatados (Carreras e Pignata, 2001; Garty et al., 2001; Szczepaniak e Biziuk, 2003) em alguns casos a confirmação de dados de campo, são realizados através de testes laboratoriais sob condições controladas, favorecendo ao conhecimento do comportamento liquênico em relação ao contaminante utilizado. Esses tipos de experimentos são importantes, pois os dados obtidos no ambiente recebem influência de fatores bióticos e abióticos. O comportamento deste organismo é medido através da análise morfofisiológica de seus componentes, que expressam o grau de alteração obtido em relação à substância utilizada. Este trabalho teve por objetivo a análise morfofisiológica do líquen Cladonia verticillaris em ensaio de laboratório com o uso de duas substâncias largamente utilizadas em indústrias de polímeros para produção de borrachas sintéticas, o estireno e o ciclohexano. Estas substâncias são líquidos inflamáveis, insolúveis em água, explosivos a determinadas temperaturas, voláteis e tóxicos para os seres vivos, principalmente o homem. O estireno, possui odor forte em altas concentrações e é considerado de toxicidade aguda para o homem, podendo produzir como efeitos de sua inalação ou contato dores de cabeça, sonolência, vertigens e irritação das mucosas oculares e respiratórias (IPCS, 2007a). Já o ciclohexano com a evaporação a 20ºC, pode chegar fàcilmente a uma concentração nociva no ar. Esta substância também produz no homem alterações por sua inalação com a presença de náuseas, dor de cabeça, irritação na pele e mucosas oculares (IPCS, 2007b). A presença destes gases por escapamento ocasional ou por uma pequena liberação diária, pode provocar sérios danos aos moradores de áreas próximas as industrias. Posteriormente será realizado o biomonitoramento com o líquen C. verticillaris no perímetro de uma área industrial com a presença de indústrias de polímeros, motivo pelo qual se faz importante a realização deste ensaio, visando uma posterior comparação com os dados coletados no ambiente.

Materiais e Métodos

Área de coleta

O líquen Cladonia verticillaris (Raddi) Fr. utilizado no experimento foi coletado sobre solos arenosos de tabuleiros costeiros (cerrados) do município de Alhandra, Estado da Paraíba, cuja localização não apresenta fontes potenciais de poluentes atmosféricos. Foram ainda obtidas amostras do solo para utilização na montagem do experimento.

Montagem do experimento

Foram utilizadas cerca de 10g de C. verticillaris (Raddi) Fr., dispostos sobre 320g de solo e acondicionados em recipientes com cúpula transparente, localizado sob condições naturais de luminosidade, compreendendo aproximadamente um fotoperíodo de 12/12h, sendo mantida a temperatura ambiente com uma média de 27ºC diários, por um período de 15 dias. Este material, em três recipientes distintos, foram borrifados a cada 72h a 20cm de altura com 4ml com estireno, ciclohexano e água deionizada. As amostras controle são de dois tipos: a primeira se refere ao material em tempo zero, ou seja, amostras do material coletado em Alhandra na área livre de fontes contaminantes e sem recebimento de nenhum tipo de tratamento; e o segundo controle refere-se a amostras coletadas em tempo igual ao das demais amostras do experimento, estas recebem água deionizada, servindo de parâmetro de comparação de resultados.

Amostras para análise foram retiradas após 3, 5, 10 e 15 dias de exposição, coletadas em pontos diferenciados nos recipientes, alternando entre as laterais e centro, realizado tanto para as amostras controle com utilização de água deionizada como para amostras com a utilização do estireno e do ciclohexano.

Cromatografia de camada delgada (CCD)

Após cada coleta, extratos orgânicos de amostras de C. verticillaris expostas ao estireno, ciclohexano e água deionizada, foram extraídas a frio com acetona. Estes foram evaporados à temperatura ambiente (28 ±3ºC), e utilizados para cromatografia de camada delgada (CCD), onde foram aplicados em cromatoplacas de sílica gel Merck F245+66, juntamente com padrões de atranorina (ATR) e ácido fumarprotocetrárico (FUM), principais constituintes de C. verticillaris. As placas foram desenvolvidas em sistema unidimensional de solventes A (tolueno:dioxano:ácido acético, 180:45:5, v/v), conforme Culberson (1972). Após evaporação dos solventes, a placa foi revelada sob luz UV curta e longa, posteriormente pulverizada com H2SO4 a 10%, e aquecida a 100ºC por ~1h, para reação de coloração das bandas.

Cromatografia líquida de alta eficiência (CLAE)

Os mesmos extratos e padrões foram utilizados em todos os ensaios, para CLAE estes extratos foram dissolvidos em éter e injetados em cromatógrafo líquido Hitachi, acoplado a um detector de ultravioleta a 254nm. Foram utilizados como parâmetros de análise, coluna de fase reversa C18, fase móvel, metanol/água/ácido acético (80:19,5:0,5, v/v), fluxo 1,0 ml·min-1, pressão 84atm, atenuação 6, temperatura ambiente (28 ±3ºC), conforme metodologia de Legaz e Vicente (1983). Foram utilizados padrões de substâncias puras (ATR; FUM) e interpretados segundo tempo de retenção das substâncias na coluna, analisando a área do pico, que determina a concentração de cada uma no extrato orgânico obtido.

Microscopia eletrônica de varredura (MEV)

Foi realizada a análise da superfície externa do líquen natural do meio ambiente e das amostras submetida aos testes de laboratório com aplicação das substâncias citadas. Amostras do material natural, exposto e controle foram montadas em suporte metálico, com o auxílio de fita adesiva dupla face revestida por carbono, e submetida à metalização durante 1min em atmosfera de argônio, 0,1mbar, com preparação do material em Fine Coat Ion Spulter JFC-1100. O material resultante recoberto por uma camada de ouro de cerca de 20nm, sendo em seguida observado em microscópio eletrônico de varredura (Marca Jeol, 5600-LV).

Resultados e Discussão

A análise de C. verticillaris transportada de tabuleiros costeiros de Alhandra, PB, e submetida à ação do estireno e ciclohexano sob condições controladas no período de 15 dias apresentou comportamento diferente nas duas situações. No resultado da análise de CCD foi possível observar a produção do ácido fumarprotocetráico e traços de atranorina na amostra controle confirmando o referido por Ahti et al. (1993). Já as amostras submetidas ao estireno, apresentaram bandas mal evidenciadas ou ausentes dessas substâncias, sugerindo uma redução da produção das mesmas (Figura 1). No caso das amostras que receberam o ciclohexano, ocorre a presença de bandas mal definidas do ácido fumarprotocetráico e da atranorina (Figura 2).

Ao mesmo tempo foi possível observar a presença de outras bandas que indicam a presença de substâncias intermediárias e/ou produtos de degradação, sugerindo que a assimilação dos contaminantes utilizados pela célula possa ter destruído as clorofilas e/ou os cloroplastos, prejudicando a fotossíntese ou inibindo a síntese da substância principal de C. verticillaris, o ácido fumarprotocetráico.

Comparando os dois experimentos observa-se na cromatografia de camada delgada (CCD) que quando os líquens são borrifados com o ciclohexano causa maiores danos à espécie, alterando mais visivelmente a produção de suas substâncias principais, atranorina e o ácido fumarprotocetráico, como demonstrado nas Figuras 1 e 2.

Através da CLAE foi possível a identificação de substâncias presentes em C. verticillaris, onde as amostras controle, submetidas à água deionizada, apresentaram com 3 dias picos de produção de substâncias liquênicas aos 4,97min., para o ácido fumarprotocetrárico, e picos aos 20,59min., que sugerem a presença da atranorina (Figura 3). Para o mesmo período amostras submetidas ao estireno, apresentaram picos de substâncias aos 4,47min e 26,08min para o ácido fumarprotocetráico e atranorina, respectivamente. Foi possível observar ainda a presença de picos aos 3,18 e 3,46min, próximos aos teores padrões do ácido protocetrárico, e das substâncias intermediárias da biossíntese do ácido fumarprotocetrárico (Figura 4). Para as amostras submetidas ao ciclohexano com 3 dias detectou-se a presença de pico com tempo de retenção de 4,89min referente à produção do ácido fumarprotocetráico e com 21,85min, sugerindo a presença da atranorina (Figura 5).

A análise das amostras evidenciaram ao longo do período de tempo a ausência de picos próximos a atranorina, bem como alterações significativas dos picos de substâncias intermediárias, presentes nas amostras controle. As substâncias produzidas não identificadas, podem ser o ácido hipoprotocetrárico e seu aldeído, que são produtos, intermediários da síntese do ácido fumarprotocetrárico (Pereira et al., 1999). C. verticillaris quando exposta ao meio ambiente urbano em Jaboatão dos Guararapes demonstrou comportamento semelhante (Silva, 2002). É também possível que o líquen tenha sido bloqueado em alguma etapa de seu metabolismo secundário, impedindo assim a síntese completa do ácido fumarprotocetrárico, o que pode gerar o acúmulo dos produtos intermediários referidos, deixando o talo liquênico vulnerável aos contaminantes. Isto pode também levar ao deslocamento de fenóis da medula para o córtex como estratégia de sobrevivência do líquen (Reyes et al., 1994).

Na análise ao microscópio eletrônico de varredura (Figura 6) observa-se uma deposição de partículas no córtex, após a aplicação do estireno e ciclohexano. Amostras com 3 dias de exposição, submetidas ao estireno apresentaram uma camada de deposição no córtex, porém sendo possível observar as delimitações das estruturas do córtex superior (Figura 6b), já nas amostras submetidas ao ciclohexano o córtex ficou recoberto por uma densa camada que em algumas áreas impossibilitou a observação das delimitações das estruturas (Figura 6c). Estes dados quando comparados com as amostras controle (Figuras 6a) se tornam ainda mais evidentes, uma vez que nestas é possível observar as delimitações da estrutura cortical, representada pelas hifas agrupadas no córtex, o que indica a preservação da estrutura externa do líquen. A amostra submetida ao estireno com 10 dias de exposição, demonstra danos à sua superfície, podendo ser observado áreas de exposição das hifas agrupadas frouxamente, o que indica um desgaste ou descamação das hifas das parte mais externa do córtex (Figura 6d). A amostra submetida ao ciclohexano por sua vez mesmo com a permanecia de uma densa camada de deposição da substância, apresenta áreas de exposição das hifas, novamente sugerindo uma descamação da parte superficial do córtex (Figura 6e).

Na análise morfológica da superfície do líquen, em observação sob microscopia eletrônica de varredura é possível avaliar os danos causados pelos contaminantes, relacionando com o espaço de tempo para o início da ação destas substâncias, o que ressalta o uso dos líquens como bioindicadores imediatos de contaminação atmosférica.

De acordo com os resultados demonstrados é possível concluir que C. verticillaris responde com alterações morfofisiológicas, em curto espaço de tempo, à ação de contaminantes em condições de laboratório, indicando a sua possibilidade de utilização como bioindicador imediato de contaminação, fato que deve ser confrontado com ensaios de campo em áreas próximas a fontes emissoras de contaminação. Dentre os produtos utilizados o ciclohexano provocou queda na produção do ácido fumarprotocetráico, principal composto de C. verticillaris, além do acúmulo de produtos intermediários de sua biossíntese e um maior desgaste das estruturas externas do líquen, indicando ser mais danoso ao líquen que o estireno. Os resultados aqui apresentados confirmam os objetivos do trabalho, podendo a partir deste o líquen C. verticillaris ser utilizado em ensaios ambientais como bioindicador, demonstrando assim que líquens terrícolas também podem ser utilizados como bioindicadores.

REFERÊNCIAS

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