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Archivos Latinoamericanos de Nutrición

versión impresa ISSN 0004-0622versión On-line ISSN 2309-5806

ALAN v.50 n.2 Caracas jun. 2000

 

Fatores de risco ao retardo de crescimento estatural em crianças de baixo nível económico e social de São Paulo, Brasil

Paulo R. Gallo, Hugo Amigo, Leone Claudio

Instituto da Criança da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Brasil

RESUMO. Objetivando analisar fatores detenninantes do retardo de crescimento em crianÿas na idade escolar, realizou-se um estudo caso - controle com 153 pares de crianÿas entre 7 e 8 anos de idade, de escolas públicas da periferia de São Paulo. Os casos, definidos como crianÿas com estatura entre -1 e -2 escore Z e os controles situados entre ± 0,5 escore Z de estatura/idade, pelo referencial do NCHS –OMS. Critérios complementares de sexo, idade, escola, classe e turno escolar foram utilizados no pareamento. A estatura, foi medida na escola por profissionais treinados segundo protocolo da OMS, e as informações sócio-econômicas e ambientais, coletadas nos domicílios. As informações foram analisadas por método univariado condicional e, posteriormente, por método multivariado em regressão logística incondicional incluindo as variáveis significativas. No modelo final, a estatura materna foi tratada como variável contínua, escalonada em , desvios padrão, e as demais foram tratadas como variáveis discretas, cosiderando apenas a presença, ou não, do fator de risco. Foram feitos também testes de correlação múltipla, mantendo-se apenas um dos fatores de risco, sempre que houvesse correlação (r = 0,5 e p<0,01). Nos resultados, o modelo final de regressão revelou as siguintes razões de chance (OR) e Intervalos de Confiança (IC): estatura da mãe: aumento de 1,84 (IC: 1,35 - 2,49) na OR para baixa ura do escolar, para cada redução de 1 dp da estatura materna; presença da condição de miséria: OR=9,20; (IC: 3,35 - 25,13); presença de baixa qualidade de alimentação: OR=2,59; (IC: 1,44- 4,63); antecedente de baixo peso ao nascer: OR= 2,59; (IC: 1,44-4,63 ) e presença de hábito de fumar na gestação: OR=l,75; (IC: 0,98-3,12).

Estes resultados salientam a influência dos fatores ambientais sobre crescimento da criança nos sete primeiros anos de vida. Entretanto, a significante OR observada para a estatura da mãe, permite pressupor que estatura dos pais não deve ser ignorada como um dos possíveis determinantes de prognóstico de menor estatura, mesmo entre crianças de baixo nível socio-econômico.

Palavras chave: Baixa estatura, retardo do crescimento, escolar, factores de risco.

SUMMARY. Risk factors of growth retardation of low socio- economic level children, São Paulo, Brazil. Aiming to analyze the mild to moderate growth retardation associate factors in children at school age, a case control study was conducted with 153 pairs of seven and eight years old children from public schools of the outskirts of the city. The cases were defined as children with a height for age(H/A) between -1 and -2 Z score, according to NCHS/WHO standards, and matched with a H/A ± 0.5 Z-score children of same age, gender, school, classroom and class time, as controls. The height was measured at school according to WHO roles by trained professionals, and household visits were carried out to obtain environmental and socio-economic data. Initially the data was analyzed by the univariate conditional method and then, the statistically significant variables were included in a model of multivariate logistic regression analysis. As a result, the risk factors remaining at the end of the multivariate analyses, by Odds Ratio and it's 95% Confidence Interval were respectively:- mother's height: for each decrease of one standard deviation the OR increased 1.84(CI:1.35 to 2.49); inadequate feeding pattem: OR=2.12; CI:1.17 to 3.83, very low socio-economic level: OR=9.2; CI:3.35 to 25.13,low birth weight: OR=2.59; CI:1,44 to 4.63 and smoking during pregnancy: OR=l,75; CI:0.98 to 3.12.

These results highlight the environment as a determinant factor for growth performance during the first years of the child's life. Despite this, the significant OR for Mother's height allows the assumption that besides the environment, the parent' s height has to be considered as one of the determinants of height deficit, even for the low socio- economic level.

Key words: Stunting, growth retardation, risk factors.

Recibido: 03-09-1999 Aceptado:27 -04- 2000

INTRODUCÃO

No Brasil está ocorrendo uma progressiva redução da prevalência das formas moderadas e graves de desnutrição infantil, como pode ser evidenciado a partir das pesquisas nacionais realizadas respectivamente nos anos 1974, 84 e 89 (1,2). Esta redução não é um fenômeno isolado, mas é concomitante à mesma tendência de declínio que se observa na mortalidade infantil e de menores de 5 anos, na proporção de nascimentos de baixo peso e outros agravos à saúde e o aumento da esperança de vida ao nascer (3).

Todos estes indicadores não são simples retratos momentâneos mas representamn, e são resultantes de, um processo de mudança gradual, não só das condições de saúde, mas, também, de um processo de transição demográfica e epidemiológica, reconhecida internacionalmente (4). Admite-se que esta transição está associada a mudanças de hábitos e comportamentos que, por sua vez, influenciam as condições e o modo de vida das pessoas.

Neste contexto de mudanças, é possível prever no futuro uma redução ainda maior das taxas de desnutrição infantil, principalmente das formas moderada e grave, mas com a persistência de algum déficit de estatura, especialmente nas populações de baixa renda existentes em diferentes áreas do país.

Atualmente, no Brasil, a relação altura para a idade vem senda preconizada para aferir as taxas de desnutrição, dado que as prevalências de déficits ponderais já são baixas, o que torna os indicadores baseados no peso menos sensíveis tanto para o diagnóstico de prevalência quanto para o acompanhamento de sua evolução ao longo do tempo (5). Este nava cenário epidemiológico, em que há um predominio de formas leves de retardo de crescimento estatural por desnutrição, implica na necessidade de se aprofundar o conhecimento dos fatores de risco associados a este retardo, buscando elementos que contribuam para direcionar com maior especificidade as intervenções destinadas ao seu combate.

Assim, este trabalho, desenvolvido com a perspectiva de colaborar na busca de intervenções que atenuem as conseqüências da desnutrição em nos so meio, tem por objetivo identificar fatores que podem ser associados ao retardo leve de crescimento na idade escolar, em uma área de risco social da região metropolitana de São Paulo. Optou-se por estudar escolares, crianças matriculadas no Sistema Público de Ensino, com idade entre 7 e 8 anos completos, considerados como um grupo privilegiado para a vigilância nutricional quando analisados individualmente e, sobretudo, coletivamente.

METODOLOGIA

Um levantamento preliminar em 21 escalas públicas estaduais da zona oeste da Grande São Paulo) identificou, entre 2205 escolares ingressantes no ciclo básico escolar de 1994, 153 pares de alunos integrados por crianças da mesma escola, classe, turno escolar, idade cronológica (variabilidade de 1 mês para mais ou para menos) e sexo, senda uma delas, conceitualmente portadora de déficit estaturalleve ou moderado, de acordo com o valor de seu escore Z de altura para a idade. O universo dos escolares das 21 escalas apresentava um escore Z médio de altura para idade, calculado a partir dos valores de referência do NCHS/OMS6, de menos 0,2738 ( ± 0,9914 ).

As escalas incluidas no universo de estudo foram selecionadas de acordo com um critério de proximidade geográfica a um agrupamento habitacional extremamente precário, da periferia da cidade, ronda não urbanizado e com más condições de salubridade e saneamento básico ( favela ). Assim, foram incluídas apenas as escolas que distassem no máximo duas quadras, cerca de 300 metros, de uma favela.

Os pares de alunos foram classificados em criança caso ou controle segundo características antropométricas. Foram consideradas "casos", as crianças com retardo leve no crescimento estatural, ou seja, relação altura para a idade comprendida entre menos 1 e menos 2 escores z do referencial NCHS-OMS (6). A faixa de escore Z selecionada, -1 a -2, reunia 22,6% das crianças do universo de estudo, ou seja, uma proporção praticamente 50% maior do que a esperada na distribuição da curva normal entre estes limites. Isto, na prática, significava que um escolar em cada três, compreendidos neste intervalo de escore Z, era possivelmente portador de retardo de crescimento estatural não muito intenso.

As crianças "controles" estavam compreendidas entre menos 0,5 e mais 0,5 escore Z do mesmo referencial de altura para sexo e idade. Neste intervalo estavam compreendidos 37,9% dos escolares do universo, proporção praticamente identica a esperada na distribuição normal, de 38,2%. Foi selecionado apenas um controle para cada caso e só participou do estudo uma criança de cada família. O emparelhamento das crianças obedeceu a um ordenamento seqüencial decrescente dos valores de escore Z apresentados pelos casos. O aplicativo Anthro, da Divisão de Nutrição do Centro de Controle de Enfermidades- EUA (CDC- USA), foi utilizado para o cálculo dos valores do escore z e o «software» de estatística SPSSÒ para a análise (7,8).

Outros critérios para inclusão e permanência dos pares no estudo, além dos já referidos para o emparelhamento, foram observados e estão pormenorizados no quadro l. No caso de não cumprimento das exigências para uma das crianças, o par era descartado, sem substituição.

QUADRO l

Critérios para inclusão, permanencia e análise das crianças no estudo.

l. Critérios para inclusão de crianças:

  1. Concordância dos pais
  2. Ausência visível de malformaçêles em exame clínico realizado pelo pediatra treinado das equipes de campo

observação: Nas situações em que houve a seleção de mais de uma criança de uma mesma família, apenas uma de las, escolhida aleatoriamente, poderia fazer parte do estudo.

2. Critérios para permanencia de crianças no estudo:

  1. Renda familiar per capita inferior a 2,5 salários mínimos na ocasião da entrevista domiciliar. (U$: 150).

O tamanho da amostra, 153 pares, foi calculado para um nível de significância de 5% e um poder de teste de 80%, definindo-se uma razão de chances( OR) maior ou igual a 2,5 e uma prevalência mínima do Calor de risco entre os controles de 10%.

Em um segundo momento, um formulário padronizado, com aproximadamente 50 tipos de informações, com base em experiência similar realizada em estudos de crescimento no Chile 9 e validado para a realidade brasileira em etapa anterior à sua utilização, foi aplicado a cada uma das 306 famílias (153 pares de crianças) coletando-se informações bio-médicas e histórico-sociais, por equipes compostas por pediatras, enfermeiros e auxiliares de enfermagem, previamente treinados. Os entrevistadores atuaram desconhecendo se tratava de caso ou de controle e eram orientados a preencher todas as informações dos formulários em até três tentativas previamente marcadas. As informações foram digitadas a seguir e avaliadas quanto à sua consistência.

As variáveis, em número de 39, foram preliminarmente analisadas segundo técnica univariada, adotando-se como ponto de corte o descrito na literatura ou então um ponto compatível com a distribuição percentilar observada para aquela variável. Má adequação do cardápio alimentar semanal foi definida a partir de uma escala de pontuação resultante da avaliação da freqüência das refeições e do tipo e da quantidade de alimentos consumidos durante a semana pela família da criança, classificação esta baseada na proposta da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (10). A definição de miséria foi baseada no ponto de corte correspondente ao primeiro tercil da distribuição de freqüências da somatória da pontuação de várias condições ambientais a saber: tamanho da familia; presença de pai biológico; escolaridade do pai ou da mãe (prevalecendo a maior); ocupação do pai ou mãe (prevalecendo a de maior valor); tipo de moradia; propriedade do domicílio; relação pessoas/cama; presença de energia elétrica e água no interior do domicílio; presença de cozinha unifamiliar; destino dos excretas; destino do lixo e presença de equipamentos domésticos. Este índice foi elaborado de acordo com o método de Graffar validado à realidade brasileira (11,12).

Finalmente, foram elaborados modelos de regressão logística segundo técnica incondicional, passo a passo, com as 14 variáveis que apresentaram associação significativa dentro de um limite de aceitabilidade, p de até 10%, nas análises univariadas pela técnica da Mantell-Haenszel (18). O ingresso no modelo de regressão obedeceu, além da significância, a hierarquia presumível de um modelo explicativo teórico. De forma deliberada foram excluídas do modelo as variáveis "estatura paterna" e a "escolaridade de ambos os pais". A primeira destas variáveis, por problemas de consistencia em 43% dos pares pesquisados, o que resultaria em um risco extremamente elevado de viés em sua interpretação, e a segunda, escolaridade de ambos os pais, por não poder ser considerada como variável independente. Objetivando evitar viéses decorrentes de multicolinearidade, foram feitos também testes de correlação múltipla, mantendo-se apenas um dos fatores de risco, sempre que houvesse correlação entre os mesmos (r = 0,5 e p<0,01).

RESULTADOS

Na Tabela 1 destaca-se o valor da odds ratio com seus respectivos Intervalos de Confiança de 95% e valores de p obtidos na análise univariada. Destaca-se, como estatisticamente siginificante, um conjunto de fatores sócio- econômicos adversos, que podem ser reunidos nos grupos: 1 ) saúde inadequada; reunindo as variáveis «Menos de três consultas no pré-natal» e «Calendário de vacinação incompleto»; 2) competição por escassos recursos disponíveis; reunindo as variáveis «Maior número de crianças menores na família» «Alto número de pessoas por cômodo habitável»; 3) baixa enda familiar per capita; inferior a 0,5 salário por mês e; 4) miséria segundo classificação sócio-econômica: definida a partir de uma escala de pontuação baseada em características sócio-culturais da família e do seu ambiente de vida.

Nesta análise, também adquirem relevância fatores diretamente relacionados com a gravidez e com características do recém nascido como o baixo peso ao nascer e o hábito le fumar na gestação.

 

TABELA 1

Fatores associados ao retardo leve de crescimento dos escolares pela analise univariada, pela ordem de entrada no processo de modelagem multivariada

Ordem

de entrada

Fator em estudo

ORMH*

IC**

pORMH***

1

Ausência do pro biológico no núcleo familiar

1.63

0,9 a 2,2

0,0777

2

Menos de 3 consultas no pré-natal

1,29

0,4 a 4,1

0,0803

3

Calendário de vacinação incompleto

1,96

1,2 a 3,3

0,0090

4

Mádequação do cardápio alimentar semanal

1,81

1,1 a 3,0

0,0055

5

Antecedentes de internação da criança

1,59

1,0 a 2,7

0,0730

6

Mais de 3 menores de 14 anos de idade na familia

2,04

1,2 a 3,5

0,0059

7

Mais de 2 pessoas por cômodo do domicilio

2,33

1,4 a 4,l

0,0012

8

Idade do pai inferior a 40 anos

1,94

1,1 a 3,6

0,0279

9

Idade da mãe menor de vinte anos

1,62

0,9 a 2,9

0,0796

10

Miséria segundo cIassificação sócio-econômica

2,88

1,6 a 5,4

0,0002

11

Renda familiar per capita abaixo de 0,5 salários mínimos

1,72

1,0 a 2,9

0,0395

12

Hábito de fumar da mãe durante a gestação

2,20

1,3 a 3,9

0,0040

13

Peso ao nacer inferior a 2500 g

3,21

1,7 a 6,3

0,0009

14

Escalonamento da estatura materna a intervalos de um desvio padrão (5,9 cm)

2,0

1,4 a 3,1

0,0001

*ORMH :- razão de chances segundo método de Mantell-Haenszel,

**IC:- intervalo de confiança de 95%,

*** pORMH:- probabilidade de associação.

A Tabela 2 mostra o modelo final da análise de regressão com os 5 fatores em estudo que permaneceram residuais no processo de modelagem. Nota-se que, apesar de se tratar de um estudo que controlou, na seleção da casuística o grupo social, a miséria é apontada como o fator milis significativo na determinação do retardo leve de crescimento. Interessante, inclusive, destacar a presença do baixo peso ao nascer e do hábito de fumar durante a gestação, indicando direta ou indiretamente a relevância do passado gestacional da criança, além da inadequação alimentar da família na época da entrevista. Também persiste no modelo, de forma bastante significativa, a baixa estatura materna.

 

TABELA 2

Valores das razões de chance (OR) e intervalo de confiança de 95%, dos fatores de risco resultantes do processo de análise multivariada

Intervalo com 95%

de Confiança

Variável

OR

Limite

Inferior

Limite

Superior

Hábito do tabagismo materno na gestação

1,75

0,99

3,12

Peso ao nascer abaixo de 2500 g

2,58

1,44

4,62

Miséria segundo classificação sócio-económica

9,18

3,35

25,12

Má adequação do cardápio alimentar semanal

2,12

1,17

3,83

Escalonamento da estatura materna

a intervalos de um desvio padrao ( 5,9 cm)

1,83

1,35

2,49

2 log. razão de verossimilhança= 274,347; p=0,0000; 5graus de liberdade

DISCUSSÃO

A análise do modelo final, destaca o importante papel dos fatores ambientais na definiçáo do risco de retardo leve de crescimento dos escolares mas sugere também a possibilidade da influência do componente genético, representado aquí, pelo menos em parte, pela estatura da mãe, como um fator de risco. Conclusão esta, próxima à verificada por outros pesquisadores em crianças de baixo nível sócio-econômico (9) . No presente estudo, a baixa estatura da mãe apresentou o segundo maior nível de significância, o que pressupõe, portanto, que não deve ser ignorada. A importância da estatura materna já tem sido indicada no que se refere à expectativa, pelo menos individual, da eficácia das intervenções preconizadas pelos programas derecuperação nutricional (13). No presente estudo, a associação verificada com a estatura materna, permite supor que, mesmo em condições ambientais desfavoráveis, o com ponente genético, neste caso em particular, o materno, também deve ser considerado como um dos possíveis determinantes na definição de um prognóstico de menor estatura no início da idade escolar.

Mas o fato da baixa estatura da mãe ser considerada fator de risco significativo, não permite excluir completamente a possibilidade de que esta estatura materna também resulte do efeito acumulado da pobreza em várias gerações destas famílias, dado que as duas variáveis mais explicativas que ingressam no modelo final são a Estatura da mãe e a Míséria segundo Classificação sócio-economica.

É importante notar que o tabagismo na gestação, embora cronologicamente distante da idade escolar, surge como um fator de risco, independentemente de seu possível impacto sobre o peso ao nascer. Sua importância é ainda maior quando se considera a elevada freqüência deste hábito na população. A prevalência de mulheres fumantes em idade fértil na cidade de São Paulo no ano de 1990, estava ao redor de 38% (14). Freqüentemente o tabagismo é apresentado como fator de risco do baixo peso ao nascer, ao parto prematuro, à morbi-mortalidade neonatal (15), neste estudo, porém, vai além. Aparentemente crianças filhas de mães carentes que fumam na gestação, têm um risco aumentado (praticamente o dobro) de apresentar filhos com um desempenho insatisfatório de crescimento estatural.

No tocante ao peso ao nascer observou-se que está incluído entre os principais determinantes da baixa estatura analisados neste estudo. Deve-se destacar que, em diversos estudos, o pequeno comprimento ao nascer é um fator de risco mais associado a baixa estatura na idade de ingresso a escoJa (16,17). Contudo, em nosso meio, esta é uma medida pouco confiável quando coletada na rotina dos serviços de saúde.

Completando o elenco de fatores de risco para o retardo do crescimento, apareceu a má adequação do cardápio alimentar semanal, provavelmente por estar a criança em idade que se apresenta com uma velocidade ronda intensa do crescimento òsteo-muscular, pois a idade pré-escolar e o início da idade escolar correspondem ronda a um período de estirão de crescimento, o que coincide com uma fase de elevadas necessidades protéico-calóricas da alimentação diária.

Por outro lado, o modelo final não revelou significância de diversos fatores tradicionalmente citados como associados a condições sócio-econômicas menos favoráveis, tais como saneamento, acesso aos serviços de saúde, internações hospitalares, tamanho e composição da família e que portanto, poderiam interferir negativamente sobre o crescimento das crianças.

Três são, as possibilidades para o desaparecimento destes fatores. De um lado, estatisticamente, o poder do teste estabelecido a priori, poderia não ser suficiente para detectar tais associações, mas, de outro lado, ou até mesmo concomitantemente, a mudança no perfil demográfico- epidemiológico da população de São Paulo, poderia estar paulatinamente reduzindo o valor explicativo de alguns destes fatores, sobre as variações do processo de crescimento; ou ronda porque na inclusão hierarquizada das variáveis no modelo multivariado se incorpora, em primeiro lugar, o nível sócio econômico, e, este possivelmente acaba englobando o eventual efeito de outras condições ambientais adversas.

Entre estas variáveis tradicionais que desapareceram no avançar do processo de elaboração do modelo e que merecem atenção, estaria o não cumprimento do calendário vacinal, habitualmente interpretado como um indicador da qualidade do acesso da criança aos serviços de saúde, e que pode ter perdido sua importância relativa neste estudo, já que a população está domiciliada em área próxima a Postos de Saúde, o que poderia resultar em níveis elevados de cobertura vacinal, dificultando a discriminação de pequenas diferenças.

Outros fatores que desaparecem no decorrer do processo de modelagem são os relacionados ao grupo familiar. Obviamente, a maior aglomeração de indivíduos no interior do domicílio traz potencialmente um conjunto de problemas que resultam em múltiplas repercussões negativas sobre a saúde e o crescimento da criança. Aparentemente estas eventuais repercussões sobre o processo de crescimento podem ter sido minimizadas por uma contrapartida positiva, na população estudada, decorrente de melhores oportunidades de acesso aos serviços, que estariam disponíveis na cidade de São Paulo.

Finalmente, não se pode perder de vista que as crianças analisadas neste momento são portadoras de retardo leve de crescimento e, portanto, é também possível que os fatores descartados durante o processo de análise, ainda tenham importância e, explicação inversa, nos casos graves de retardo de crescimento, cujo modelo explicativo pode não ser o mesmo que o observado neste estudo. Mesmo assim, não se pode esquecer que o retardo leve de crescimento é um indicador de que, muito provavelmente, esta criança sofreu um processo de amputação de seu potencial de crescimento e desenvolvimento, que pode eventualmente resultar em um pior desempenho social do indivíduo.

Em conclusão, fica evidente que, ao lado da extrema importância dos fatores sócio- econômicos, aparecem como fatores de risco de baixa estaturaem crianças que ingressam na escola em regioes urbanas, as condições da gestação e os fatores genéticos. Todos estes fatores devem ser considerados sempre que se tenha que avaliar o prognóstico e a evolução da estatura da criança em idade escolar.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos aos muitos profissionais pelo incentivo e apoio que nos ofereceram nos vários momentos de elaboração deste irabalho e durante a fase de coleta de dados. Dentre estes profissionais, merecem destaque, a Professora Patrícia Bustos (Universidade do Chile), e toda a equipe de profissionais da Sessao de Assistência Comunitária do Instituto da Criança da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

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