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Archivos Latinoamericanos de Nutrición

versión impresa ISSN 0004-0622

ALAN vol.61 no.3 Caracas set. 2011

 

Fatores associados à adiposidade em adolescentes do sexo feminino eutróficas com adequado e elevado percentual de gordura corporal: elaboração de um modelo de risco

Poliana Ribeiro Vieira, Eliane de Faria, Franciane de Faria, Naiara Sperandio, Cristiana Araújo, Roberta Stofeles, Daniela Alves, Sylvia do Carmo Castro, Josefina Bressan, Silvia Eloiza.

Departamento de Nutrição e Saúde, Universidade Federal de Viçosa, Viçosa/MG, Brasil

RESUMO

O objetivo deste estudo foi avaliar os fatores associados com adiposidade em adolescentes eutróficas com adequado e elevado percentual de gordura corporal. Foram avaliadas 118 adolescentes do sexo feminino, de 1419 anos, estudantes de escolas públicas do município de Viçosa (Minas Gerais)/Brazil, que já haviam apresentado menarca. As adolescentes foram divididas em 2 grupos: G1 com elevado percentual de gordura corporal e G2 com adequado percentual de gordura corporal. Avaliou-se variáveis antropométricas e de composição corporal, de estilo de vida e história familiar de doenças crônicas não transmissíveis. Em subamostra determinou-se o gasto energético basal por calorimetria indireta. As adolescentes do G1 apresentaram maiores valores da maioria das variáveis antropométricas e de composição corporal (p<0,001). Não se observou diferença (p>0,05) do metabolismo basal e metabolismo de massa magra, hábito de fumar, consumo energético total, de proteínas e de lipídeos entre os grupos. Ao comparar o nível de atividade física, verificou-se que adolescentes do G1 gastaram mais tempo com atividades sedentárias de nível 1 e as do G2 apresentaram maior gasto calórico total com atividades diárias (p<0,001). De acordo com os fatores de risco analisados, as variáveis relacionadas ao estilo de vida, com destaque para uso de adoçantes (OR=13,47), foram as que mais contribuíram para o excesso de adiposidade nas adolescentes eutróficas. A análise detalhada da composição corporal assim como dos fatores de risco envolvidos com excesso de adiposidade, possibilita diagnóstico precoce e elaboração de medidas de intervenção mais adequadas.

Palavras chaves: adolescência; composição corporal; adiposidade; modelo de risco; percentual de gordura corporal.

Factors associated with adiposity in normal weight female adolescents with adequate and high percent body fat: elaborating a risk model

SUMMARY

This study was carried out to evaluate the factors associated with adiposity in normal weight adolescents presenting appropriate or high percent body fat, who attended the public schools in Viçosa county- Minas Gerais/Brazil. A total of 118 female adolescents at age range from 14 to 19 years and have already presented the menarche were evaluated. The adolescents were divided into 2 groups: G1 with high percent body fat and G2 with appropriate percent body fat. The following variables were evaluated: anthropometric, body composition, lifestyle and the family history of non-communicable chronic diseases. In subsample, the basal energy consumption was determined by indirect calorimetry. The G1-grouped adolescents showed higher values for most anthropometric and body composition variables (p<0.001). No differences were observed (p>0.05) for basal metabolism and metabolism of lean body mass, smoking habit, total energy consumption and protein and lipid as well between groups. When comparing the physical activity level, the G1 adolescents spent more time with 1-level sedentary activities whereas the G2 ones showed higher total caloric consumption with daily activities (p <0.001). According to risk factors under analysis, the variables related to lifestyle, as distinguishing the use of sweeteners (OR=13.47), provided higher contribution to excessive adiposity in the normal weight adolescents. The detailed analysis of the body composition as well as the risk factors associated with excessive body fat makes possible the early diagnosis and the development of more appropriate intervention means.

Key words: adolescence; body composition, adiposity, risk model, body fat percentage.

Recibido: 23/05/2011

Aceptado: 28/09/2011

INTRODUÇÃO

A adolescência caracteriza-se por ser uma fase de intensas transformações, que marca a transição entre a infância e a vida adulta, é cronologicamente definida como o período que vai dos 10 aos 19 anos. Eventos importantes como estirão do crescimento e a maturação sexual destacam-se neste momento (1).

A classificação do estado nutricional do adolescente é complexa vista as alterações que ocorrem durante este estágio da vida. Sendo assim, diferentes indicadores, como antropometria, exame clínico, bioquímico e avaliação da composição corporal devem ser utilizados para se obter diagnóstico mais preciso (2,3).

Alguns fatores estão associados ao excesso de adiposidade na adolescência, como hábitos alimentares inadequados, sedentarismo e consumo excessivo de bebidas alcoólicas. A menarca em adolescentes com idade inferior a 12 anos também está relacionada com maior quantidade de tecido adiposo, aumento da pressão arterial, dos lipídeos sanguíneos, insulina e glicose (4,2).

A obesidade na adolescência vem aumentando durante os últimos anos e tem sido associada ao aparecimento precoce de doenças cardiovasculares, diabetes mellitus tipo 2, hipertensão arterial, dentre outras. Nos 34 anos decorridos de 1974-1975 a 2008-2009 no Brasil, a prevalência de excesso de peso aumentou em seis vezes nos adolescentes do sexo masculino (de 3,7 para 21,7%) e em quase três vezes no sexo feminino (de 7,6 para 19,4%) (5).

A deposição excessiva de tecido adiposo principalmente na região abdominal agrava essa situação. Por isso deve-se prestar atenção ao adolescente que apresenta Índice de Massa Corporal (IMC) adequado, uma vez que este pode apresentar percentual de gordura elevado e também vir a apresentar riscos de morbimortalidade semelhantes aos com IMC elevado. Logo, torna-se evidente a importância de se avaliar a composição corporal nesta fase para prevenção das doenças crônicas não transmissíveis na vida adulta (2, 4).

Este artigo objetivou avaliar os fatores associados com adiposidade em adolescentes eutróficas com adequado e elevado percentual de gordura corporal.

MATERIAIS E MÉTODOS

Estudo transversal, com 118 adolescentes do sexo feminino, de 14 a 19 anos, do município de Viçosa (MG), tendo como critérios de inclusão: ser estudante da rede pública de ensino, eutrófica com adequado ou elevado percentual de gordura corporal, com menarca há pelo menos um ano, sem uso de medicamentos, não portadora de enfermidade crônica e não ter engravidado ou estar grávida.

Com o intuito de obter um grupo mais homogêneo, escolheu-se estudar adolescentes do sexo feminino um ano pós-menarca, pois, espera-se que elas se encontrem em fase semelhante de desenvolvimento puberal.

As participantes foram agrupadas em grupos diferentes: grupo 1 (G1): eutróficas pelo IMC para idade e sexo (IMC/I) (6), porém, com sobrepeso segundo a classificação da percentual de gordura corporal (≥30%) (7) e grupo 2 (G2): eutróficas pelo IMC/I (6) com percentual de gordura corporal normal (> 20% e < 25%) (7).

O cálculo amostral foi realizado utilizando-se o software Epi Info 6.04, para estudos transversais, considerando-se a população do município de 4.507 indivíduos na faixa etária e sexo, do estudo (8), prevalência de excesso de gordura corporal estimada em 25% (9), com variabilidade de 10% e 95% de nível de confiança, resultando tamanho amostral mínimo de 55 indivíduos. Entretanto, chegou-se a 59 em cada grupo, totalizando amostra de 118 adolescentes.

Para a seleção amostral foram escolhidas ao acaso quatro escolas públicas localizadas na região urbana do município. Realizou-se triagem com aferição de peso, estatura e percentual de gordura corporal em 560 adolescentes. Dessas, todas que atenderam aos critérios de inclusão participaram da seleção por meio de sorteio.

As adolescentes sorteadas de ambos os grupos foram submetidas à avaliação antropométrica, registro de atividades físicas e aplicação do inquérito sobre fatores de risco para o excesso de gordura corporal. Sorteou-se uma subamostra (n=24), correspondente a 20% de cada grupo, para estimativa do metabolismo basal.

Avaliação Antropométrica

O peso foi obtido em balança eletrônica, com capacidade de até 150 kg e subdivisão em 100 g. Para a aferição da estatura foi utilizado antropômetro portátil, com extensão de 2 m e escala de 0,1 cm. O peso e a estatura foram aferidos segundo as técnicas preconizadas por Jellife (10).

A avaliação do estado nutricional foi realizada através do IMC para idade e sexo, utilizando-se os pontos de corte e a referência antropométrica preconizados pela World Health Organization (6).

O percentual de gordura corporal foi estimado por bioimpedância elétrica bipolar (Tanita) e por pregas cutâneas bicipital, tricipital, subescapular, suprailíaca, utilizando-se o equipamento Lange Skinfold Caliper©, segundo as técnicas propostas por Cameron (11).

O percentual de gordura corporal, de ambos os métodos, foi analisado segundo a classificação proposta por Lohman (7). Para a adolescente ser incluída no estudo, o percentual de gordura corporal deveria coincidir com a faixa de classificação pelos dois métodos.

Para localização da gordura corporal utilizou-se o somatório das pregas cutâneas bicipital, tricipital (gordura periférica – GP) e subescapular, suprailíaca (gordura central – GC).

Calculou-se a relação entre a gordura central/periférica (GC/GP) e os índices derivados do IMC, índice de massa corporal de gordura (IMCG) e livre de gordura (IMCLG).

A gordura corporal em quilogramas (Gord kg) foi calculada a partir do percentual de gordura obtido pela bioimpedância vertical e do peso da adolescente. A massa magra em quilogramas (MM kg) foi obtida subtraindo-se do peso total a gordura em quilogramas.

As circunferências da cintura (CC) e do quadril (CQ) foram aferidas com fita métrica, com extensão de 2 metros, flexível e inelástica, dividida em centímetros e subdivida em milímetros, tomando-se cuidado para não comprimir as partes moles. A medida da CC foi aferida na menor circunferência e a CQ na maior proeminência da região glútea. Calculou-se a Relação Cintura/Quadril (RCQ) e Relação Cintura/Estatura (RCE).

Avaliação da Atividade física

Para a determinação da atividade física foi realizado o registro de 24 horas, sendo convertido em gasto calórico total com atividades, custo energético por grupo de atividades e tempo de gasto por grupo de atividades (12).

Inquérito sobre os fatores de risco

Avaliou-se o consumo de cigarros e de bebidas alcoólicas (frequência e tipo), hábito alimentar, número e tipo de refeições realizadas e uso de produtos diet/light ou desnatados. Analisou-se a história familiar de doenças crônicas não transmissíveis como obesidade, diabetes, hipertensão e alterações na tireóide.

A composição da dieta foi analisada através de um recordatório de 24 horas. Calculou-se o valor energético total (VET) ingerido, a quantidade de proteína (g), carboidratos (g), lipídios (g). A adequação da contribuição dos macronutrientes em porcentagem do valor energético total foi calculada com base na Faixa de Distribuição Aceitável de Macronutrientes (ADMR) do Institute of Medicine/ Food and Nutrition Board (13).

Estimativa do Metabolismo basal

A determinação do gasto energético basal foi realizada por calorimetria indireta, por meio do monitor metabólico Deltatrac II® (14). O metabolismo basal foi posteriormente corrigido pelo peso corporal e denominado taxa metabólica basal. Foi também corrigido pela gordura em quilogramas (Metabolismo MG) e pela massa magra em quilogramas (Metabolismo MM).

Software’s e análise estatística

A análise dos dados foi feita utilizando-se o software Epi Info, versão 6.04 e o Sigma Statistic for Windows versão 3.5. Para cálculo da composição da dieta utilizou-se o software Diet Pro 3.0. Os testes utilizados foram o Teste t de Student ou Mann Whitney, Qui-quadrado ou teste exato de Fischer, dependendo da característica das variáveis. Elaborou-se um modelo de risco a partir das variáveis que apresentaram diferenças significantes entre os grupos, sendo analisadas a Razão de Chances ou Odds Ratio (OR) e seus Intervalos de Confiança. O nível de rejeição da hipótese de nulidade foi <0,05.

Utilizou-se regressão logística simples para avaliar a associação entre o excesso de gordura corporal (variável dependente) e os fatores de risco avaliados neste estudo (variáveis independentes). As associações significantes (p < 0,20) na análise bivariada foram utilizadas na regressão logística múltipla. Para análise do ajuste dos modelos, avaliou-se a multicolinearidade entre as variáveis independentes e o poder de predição do modelo.

Considerações éticas

O projeto foi aprovado em 09 de abril de 2003, pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de Viçosa. Os participantes maiores de 18 anos ou os responsáveis pelos menores assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

RESULTADOS

Participaram do estudo 118 adolescentes com idade média de 16,4 ± 1,4 anos. A idade média da menarca foi menor no G1 (12,2 ± 1,0 anos) quando comparado com o G2 (12,8 ± 1,2 anos) (p = 0,003).

Ao comparar os parâmetros antropométricos e de composição corporal, encontrou-se que as adolescentes do G1 apresentaram maiores valores de peso, IMC, IMCG, circunferências da cintura e do quadril, relação cintura-quadril e cintura-estatura, gordura subcutânea central e periférica (p < 0,001) (Tabela 1).

TABELA 1

Média, desvio padrão e mediana das variáveis antropométricas e de composição corporal de adolescentes eutróficas de 14 a 19 anos, segundo grupos de estudo. Viçosa, MG/Brasil.

Já em relação ao metabolismo basal e ao metabolismo basal de massa magra, não se encontrou diferença entre os grupos (p=0,75 e p=0,84, respectivamente). Entretanto, as medianas do metabolismo basal corrigido pelo peso (Taxa Metabólica Basal – TMB) e o corrigido pela massa de gordura (TMBG) foram maiores no G2 (TMB=30,5 kcal/kg peso/dia e TMBG=131,5 kcal/kg de gordura/dia) quando comparados com o G1 (TMB=26,5 kcal/kg peso/dia e TMBG=83,6 kcal/kg de gordura/dia) (p < 0,001).

Não se obteve diferença entre os grupos (p = 0,69) quanto ao hábito de fumar, sendo este presente em 3,3% da amostra total. Por outro lado, verificou-se que 31,4% das meninas consumiam bebida alcoólica, sendo que a maioria (62,2%) pertencia ao G1 (p = 0,07). As bebidas mais consumidas foram cerveja e vinho, sendo este mais consumido no primeiro grupo (p = 0,001). Do total, 46,6% realizavam cinco refeições diárias e 34,7% substituíam o jantar por lanche, sem diferença entre os grupos (p > 0,05). Entretanto, verificou-se que maior número de meninas do G1(11,9%) omitia o desjejum (p = 0,03). O consumo de produto diet/light ou desnatado foram mais frequentes no G1 quando comparado com o G2, sendo o adoçante o de maior consumo (p = 0,006).

Conforme os dados apresentados na Tabela 2, não se encontrou diferença (p > 0,05) no consumo energético total, de proteínas (em gramas) e de lipídios entre os grupos. Porém, verificou-se que o G1 ingeriu menor quantidade e proporção do VET de carboidratos, bem como maior proporção de proteínas quando comparado com o G2 (p<0,05).

TABELA 2

Média, desvio padrão, mediana das quantidades de macronutrientes (g) e do percentual do valor energético total do recordatório alimentar de adolescentes eutróficas de 14 a 19 anos, segundo grupos de estudo. Viçosa, MG/Brasil.

Em relação à distribuição calórica dos macronutrientes, não se encontrou diferença no percentual de inadequação pela AMDR (13) no consumo de carboidratos (<45% ou >65% do VET), de proteínas (<10% ou >35% do VET) e de lipídios (>35% do VET) entre os grupos.

Ao comparar o nível de atividade física, verificouse que as adolescentes do G1 gastaram mais tempo com atividades sedentárias de nível 1, que, em geral, são caracterizadas por “dormir” ou “estar deitado” totalizando 9 horas por dia, enquanto que as do G2 gastaram 8 horas e 27 minutos por dia com essas atividades (p < 0,05) (Tabela 3).

TABELA 3

Média, desvio padrão, mediana do tempo gasto em minutos por dia nos níveis de atividade física pelas adolescentes eutróficas de 14 a 19 anos, segundo grupos de estudo. Viçosa, MG/Brasil.

Ao agrupar as atividades em sedentárias (ATF1 a 3) e não sedentárias (ATF4 a 9) não se encontrou diferenças entre os grupos (p > 0,05). Entretanto, o G2 apresentou média de 40 minutos a mais em atividades não sedentárias realizadas diariamente (Tabela 3).

O gasto calórico com atividades sedentárias (ATF1, ATF2, ATF3) foi maior no G1 comparado com o G2 (p < 0,05). Também houve diferença em relação ao gasto calórico total despendido com atividades realizadas diariamente pelas adolescentes, sendo este maior no G2 (p < 0,001) (Tabela 4).

TABELA 4

Média, desvio padrão, mediana do gasto calórico por níveis de atividade física e gasto calórico total por dia de adolescentes eutróficas de 14 a 19 anos, segundo grupos de estudo. Viçosa, MG/Brasil.

Verificou-se que 77,1% apresentavam história familiar de doenças crônicas não transmissíveis, sendo a hipertensão arterial mais frequente no G1 (p = 0,04).

De acordo com os fatores de risco analisados neste estudo, encontrou-se que o modelo de risco para o excesso de adiposidade em adolescentes eutróficas, apresenta maior contribuição de variáveis relacionadas ao estilo de vida, com destaque para o uso de adoçantes (Figura 1).

FIGURA 1

Modelo de risco para o excesso de adiposidade em adolescentes eutróficas de 14 a 19 anos. Viçosa, MG/Brasil. (adaptado de 15).

DISCUSSÃO

O IMC é utilizado para classificação do estado nutricional que diferencia indivíduos em baixo peso, eutróficos, sobrepesos ou com obesidade. Porém, a literatura mostra que nem sempre aqueles considerados baixo peso e eutróficos possuem percentual de gordura corporal adequado, o que torna indispensável o uso de mais instrumentos para tal avaliação. Em estudo realizado com adolescentes recém ingressos em universidade pública brasileira, dos 93% considerados eutróficos segundo o IMC, 58,7% apresentaram percentual de gordura acima do esperado, o que reforça a necessidade da avaliação desse parâmetro como forma de identificar possíveis fatores de risco à saúde (9).

As adolescentes do G1 podem ser denominadas como metabolicamente obesas de peso normal uma vez que possuem alto percentual de gordura corporal, podendo se comportar de modo semelhante a indivíduos com excesso de peso. Apesar do presente estudo não ter avaliado parâmetros bioquímicos e clínico, a literatura mostra que o excesso de gordura corporal pode aumentar os riscos de alterações metabólicas como dislipidemias, resistência à insulina, tolerância diminuída à glicose e hipertensão arterial, fatores estes que quando presentes simultaneamente em um indivíduo determinam o diagnóstico da síndrome metabólica (16).

Os maiores valores das medidas antropométricas, assim como a localização central da gordura corporal, encontradas para o G1 confirmam a relação destas com o excesso de adiposidade (Tabela 1). Serrano et al. (3) também encontraram correlação forte (r > 0,67) desta variável com peso, IMC, CC e CQ, além de similaridade de alterações de pressão arterial, HDL e glicemia entre as adolescentes eutróficas com alto percentual de gordura corporal e as com excesso de peso.

A diferença dos valores de IMC encontrada entre os grupos de estudo (Tabela 1) pode ser atribuída à ampla faixa desse índice utilizada para a classificação de eutrofia, que compreende os valores entre os percentis 3 e 85 (6), o que torna uma limitação do estudo, visto que o G1 apresentou maior mediana de IMC e intervalos maiores. Desta forma, sugere-se para a realização de outros estudos, a utilização de uma faixa menor de normalidade, por exemplo, entre o percentil 25-75 para maior homogeneização da amostra.

Uma característica dessa fase de crescimento e desenvolvimento é a maturação sexual, cujo marcador no sexo feminino é a menarca. No grupo de estudo a ocorrência da menarca em idades menores foi evidenciada para as meninas do G1, achado semelhante ao estudo de Terres et al. (17). Isso pode ser explicado pela necessidade de atingir um peso crítico para iniciar o estirão de crescimento e as modificações inerentes à puberdade, sendo que o peso deve ser constituído por no mínimo 17% de gordura para as meninas atingirem a menarca (18, 19).

Foram verificadas maiores inadequações dietéticas no G1 representadas por omissão do desjejum e o uso de produtos diet/light, além de maior percentual de inadequação na ingestão de carboidratos e proteínas (Tabela 2). Vale ressaltar que para avaliação dietética foi aplicado apenas um recordatório 24 horas, o que pode limitar os resultados referentes à mesma.

A adoção de práticas que objetivam redução de peso é comum neste grupo, cabendo destacar a restrição da ingestão de carboidratos e o uso de produtos como adoçantes. No entanto, para compensar essa restrição, há aumento na participação de lipídios na dieta, contribuindo assim para alterações na composição corporal, como aumento da adiposidade (20). Comportamento semelhante ocorre com a omissão de refeições, que pode alterar o metabolismo de carboidratos e lipídios e favorecer o aumento de gordura corporal em relação à massa magra (9). Portanto, verifica-se que alterações dietéticas podem, notadamente, influenciar a regulação do peso corporal.

O consumo de bebidas alcoólicas como a cerveja e o vinho também foi maior no G1. De acordo com Ferreira et al. (21) a cerveja parece ser a bebida alcoólica que apresenta maior associação com a gordura corporal central. Essa associação tem origem no fato de que o tipo, a dose e o tempo de consumo das bebidas levam a alteração dos marcadores antropométricos de localização de gordura.

Fatores genéticos e ambientais podem influenciar a resposta da TMB, entre eles: raça; gênero; clima e região; maturação sexual; idade; prática de atividade física e a relação do tamanho corporal (22).

As meninas do G1 gastaram maior tempo com atividades sedentárias (Tabela 3) e o gasto energético com atividade física foi maior no G2 (Tabela 4). O fato de o G2 ter dispendido mais tempo com atividades de gasto energético moderado e pesado e em média 40 minutos a mais em atividades não sedentárias, pode ter influenciado no aumento da TMB. Além disso, a massa magra, que apesar de ter apresentado valores de medianas semelhantes nos dois grupos, representou percentual diferente em relação ao peso corporal (Tabela 1), contribuindo para a variação da TMB (22, 23).

Vale ressaltar também que na avaliação do risco para saúde desses adolescentes deve-se levar em consideração o histórico familiar para doenças crônicas não transmissíveis (DCNT). Este esteve presente na maioria das avaliadas (76,2%) com associação entre a história familiar de hipertensão e adiposidade. Gontijo et al. (24) encontraram grande parte dos adolescentes estudados com algum histórico familiar para DCNT, destacando a hipertensão arterial (70,4%), hipercolesterolemia (57,3%), diabetes (52,3%) e obesidade (49,2%), embora sem associação de nenhum deles com a síndrome metabólica.

O modelo de risco para o excesso de adiposidade construído agrupa os fatores citados anteriormente e confirma a contribuição de variáveis modificáveis (ambientais) e não modificáveis (genéticas), tendo como base aquelas relacionadas ao estilo de vida (Figura 1).

A identificação desses fatores na adolescência favorece o diagnóstico precoce e o planejamento de orientações específicas para correção de hábitos inadequados. Assim, a educação alimentar e nutricional e a prática de atividade física é essencial para a redução dos riscos de desenvolvimento de alterações metabólicas na adolescência e para manutenção da saúde na vida adulta.

CONCLUSÃO

Os achados do presente estudo reforçam a importância da análise da composição corporal na avaliação do estado nutricional, uma vez que adolescentes eutróficos pelo IMC/idade podem apresentar excesso de adiposidade, sendo metabolicamente semelhantes aqueles com sobrepeso e obesidade.

Os fatores de risco para elevado percentual de gordura corporal encontrados no estudo mostram a influência de fatores genéticos, ambientais e metabólicos como história familiar de hipertensão arterial e obesidade na infância, porém destaca-se que os maiores riscos foram relacionados aos fatores comportamentais, no que se refere a hábitos alimentares inadequados como o uso de adoçantes e omissão do desjejum.

Diante disto, ressalta-se a importância de se avaliar a composição corporal detalhada e não apenas a utilização do IMC para classificação do estado nutricional, bem como conhecer os fatores biológicos, sociais e comportamentais que possam estar associados ao elevado percentual de gordura corporal, possibilitando desta forma a realização do diagnóstico precoce e de intervenções que promovam o desenvolvimento de estilo de vida saudáveis na adolescência.

Financiamento: FAPEMIG

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