1. INTRODUÇÃO
O aumento da longevidade da população desafia a sociedade a enfrentar problemas de saúde que estão se tornando cada vez mais complexos e diversificados. Como a saúde é um componente vital à vida, sendo construída ao longo do tempo, parece oportuno atentar para urgência do aprimoramento escolar, para a educação e a alfabetização voltadas como objeto de intervenção educacional na promoção da saúde. O desenvolvimento de ferramentas eficazes para operacionalizar essas intervenções, se faz necessário para robustecer o convívio social, diante de uma sociedade caracterizada pelo rápido processo de mudanças e pela desigualdade das pessoas e de seus grupos, expostos a riscos evitáveis ou velados dos fatores de proteção, muitas vezes, por decisão equivocada (Lima, Malacarne e Strieder, 2012).
1.1. Descrição do problema e implicações
A sociedade brasileira, tal como outras sociedades, está estratificada de várias formas diferentes. A desigualdade social, como estrutura de diferentes oportunidades e recursos numa sociedade, diz respeito à relação de possibilidades entre indivíduos ou grupos sociais. Conhecer as diferenças nas condições de vida das pessoas, fornece uma ideia sobre como essas diferenças afetam as condições básicas dos indivíduos, nomeadamente: a saúde e a vida (Malacarne, Strieder e Lima, 2011).
A interligação entre classe social e saúde desempenha um papel crucial na análise das disparidades sociais nos esforços de promoção da saúde. A saúde não deve ser apenas valorizada em sua essência, mas, reconhecida como um recurso habilitador para a busca de outros aspectos da vida. Essa conexão entre classe social e saúde revela como a estratificação social influencia significativamente as oportunidades de saúde disponíveis para diferentes grupos na sociedade. A classe social molda não apenas o acesso aos serviços de saúde, mas também os determinantes sociais e econômicos que afetam o estado de saúde das pessoas.
Nesse sentido, a fase escolar se apresenta oportuna por excelência para quebrar laços dessa desigualdade social, estabelecendo condições superiores de saúde aos menos favorecidos, mediante o enriquecimento de informações confiáveis e de boa qualidade. As escolas, por continuidade, se apresentam como espaços ideais para que isso aconteça (Leite et al., 2021).
Em particular, algumas qualidades e habilidades são esperadas que os alunos adquiram na educação em saúde. A tríade do arcabouço que sustenta a educação escolar em saúde deve mirar na aquisição, no desenvolvimento e no exercício de conhecimentos e habilidades. Na aquisição, o aluno aprende a fazer para viver com boa qualidade de vida. No desenvolvimento, explora a capacidade de decisões, permitindo-lhe lidar com situações peculiares. No exercício, o aluno cultiva o aprendizado, de forma independente, aplicando seus conhecimentos e habilidades para avaliar e conduzir adequadamente a própria situação de saúde, de sua família e entorno (Patja et al., 2022).
Desse modo, em um sentido mais amplo, a educação escolar em saúde deve atender a um arcabouço social, considerando previamente os estágios de desenvolvimento das crianças, para somente depois aparelhá-las para decidirem por uma vida mais saudável e segura. Ao fazer isso, é necessário estabelecer as qualidades e habilidades a ser desenvolvidas no ensino. Assim, as qualidades e habilidades perseguidas devem observar as características dos alunos, de cada disciplina, para, em seguida, inter-relacioná-los (Chan, Lee e Low, 2018).
Apreciação precisa da saúde das pessoas tem sido objeto de discussão ao longo do tempo. A tarefa de definir o conceito de saúde e, posteriormente, quantificá-lo, revelou-se mais desafiadora do que se poderia imaginar. Como resultado, as avaliações do estado de saúde das pessoas têm se apoiado cada vez mais em indicadores de morbidade e na análise de taxas de mortalidade prematura de todas as causas.
As morbidades evitáveis, ou mitigáveis tratadas neste texto, se reportam às doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), como as doenças cardiocirculatórias, respiratórias, osteoarticulares, metabólicas e as neoplasias. Nomeadamente, nos referimos à hipertensão arterial sistêmica, a asma brônquica, a osteoartrose e osteoporose, ao diabetes, e aos diversos tipos de cânceres. Este rol de adversidades, não excluem outras possibilidades agregadas, no entanto, são estes os alvos perseguidos pelo sistema de vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas do Ministério da Saúde brasileiro. No Brasil, as DCNT correspondem a 72% das causas de morte (Brasil, 2020).
A mortalidade precoce ou prematura, em países em desenvolvimento, como o Brasil, é definida como as mortes que ocorrem antes dos 69 anos e que poderiam ser evitadas. Este indicador de saúde é calculado pela taxa de mortalidade da população por idade, para pessoas com idade de 30 a 69 anos, pelos principais grupos de doenças crônicas não transmissíveis (doenças do aparelho circulatório, câncer, diabete e doenças respiratórias crônicas), obtido pelo número de óbitos (de 30 a 69 anos) por DCNT registrados nos códigos CID-10 - I00-I99; C00-C97; J30J98; E10-E14 - em determinado ano e local x 100.000 / População residente (de 30 a 69 anos), em determinado ano e local (Brasil, 2014).
Em outras palavras, a percepção da saúde, muitas vezes se relaciona com a presença ou ausência de doenças. Contudo, é preciso compreender que a saúde é um estado dinâmico e multifacetado, influenciado por fatores biológicos, ambientais, sociais e comportamentais. Nesse sentido, a educação em saúde desempenha um papel crucial ao esclarecer esse contexto complexo para o público (Lima e Lima, 2017).
Diante esta breve contextualização, este artigo, no formato de um ensaio acadêmico exploratório de abordagem qualitativa, examina dois conceitos inevitáveis para esta investigação: as perspectivas positivas da educação escolar em saúde, para o enfrentamento de morbidades evitáveis e mortalidade precoce e, a averiguação de lacunas presentes nesta área do conhecimento, à espera de preenchimento. Secundariamente, como produto resultante dos exames e das averiguações processadas no decurso deste trabalho, propomos um esboço ilustrativo e estruturante de domínios norteadores, capazes de suportar os conteúdos programáticos na educação escolar em saúde, para alunos do ensino básico.
2. METODOLOGÍA
Este artigo se estrutura em um ensaio acadêmico, caracterizado por um gênero textual que visa fomentar o debate crítico acerca de um tema específico, para aprofundar e integrar o conhecimento de um fenômeno. O ensaio acadêmico apresenta uma abordagem de estilo livre de escrita, tratando de um assunto sem a intenção de esgotá-lo, não devendo ser confundido com revisão da literatura.
Não existe um modelo uniforme para todos os ensaios. A estrutura deste texto acompanhou o modelo thread roll (rolo de linha), iniciando o modelo descrevendo uma perspectiva geral sobre a relevância e as lacunas a serem preenchida para estruturar a educação para saúde no âmbito escolar. Neste ensaio não trata de convencer alguém do seu ponto de vista sobre o assunto abordado, se apresentando como um texto intimista sobre as impressões, expectativas, frustrações, mudanças e reflexões pessoais de um grupo de pesquisadores sobre o fato em tela, influenciado fortemente pelo conhecimento ou vivência prévia da temática (Soleymani, Khoshnevisan e Davoodi, 2022).
A abordagem foi iniciada com uma revisão narrativa da literatura científica disponível sobre a consulta de educação para a saúde no âmbito escolar. A consulta on-line avançada foi realizada nas bases de dados: Scientific Electronic Library On-line (SciELO), Índice Bibliográfico Español en Ciencias de la Salud (IBECS) e Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS) para os descritores em português: educação para a saúde, alfabetização para a saúde, saúde na escola, utilizou-se o operador booliano “AND” no processo de cruzamento dos descritores supracitados.
Para a análise do material coletado considerou-se o modelo de análise contextual, que indica níveis interativos de relações de contexto, que facilitam a compreensão dos fenômenos. Englobando as características contextuais dos fatores relevantes do fenômeno pesquisado mais aparentes no passado e no presente, de um comportamento sociocultural que opera como resultado em uma perspectiva social partilhada. Assim, entende-se que os níveis contextuais são interativos e dinâmicos, estando apresentados em subtemas para amparar percepção de cada estrato, para ampliar a compreensão do todo (Coura et al., 2013).
3. DESAFIOS PARA A EDUCAÇÃO EM SAÚDE
Medir a saúde das pessoas de modo exato é uma questão que tem sido debatida há tempo. Definir o termo saúde, para depois mensurá-lo, revelou-se mais difícil do que se poderia pensar. Portanto, as análises sobre o estado de saúde das pessoas, baseiam-se cada vez mais em dados de morbidade e mortalidade precoce por todas as causas, ou seja, nas respostas às perguntas sobre ser ou não saudável, a imagem de saúde é percebida com frequência, associada à presença ou ausência de sofrimento por doenças (Petarli et al., 2018).
No Brasil, a Base Nacional Curricular Comum (BNCC), deve nortear os currículos dos sistemas e redes de ensino das Unidades Federativas, como também as propostas pedagógicas de todas as escolas públicas e privadas de Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio, em todo o território nacional. Essas normas consideram a saúde socioemocional além da biológica, o que dialoga com o modelo das Escolas Promotoras de Saúde. A BNCC enfatiza a saúde física e a discussão sobre as condutas que provocam impactos prejudiciais ao meio ambiente e saneamento básico, na dimensão coletiva, desconsiderando a importância da saúde mental e emocional no contexto educativo. A Pandemia do coronavírus em 2020 evidenciou a importância da educação em saúde, no âmbito individual e coletivo, assim como a relevância da saúde mental no enfrentamento dos novos desafios emergentes (Laochite, Lima Júnior, Pedersen, 2021).
Dessa forma, a educação para a saúde, não pode perder a perspectiva que a condição de saúde avaliada e o estado de saúde percepcionado, embora devam andar arrumados, não têm, necessariamente, de coincidir. Uma pessoa pode ter um diagnóstico de uma doença sem se sentir incomodada por ela ou, sem se considerar doente. Inversamente, pode sentir doente sem um diagnóstico firmado. Estes dados podem ser precários enquanto medida de saúde, mas refletem como as pessoas classificam o seu estado de saúde (Lee et al., 2022).
Outro problema imperativo e imprescindível para compor o conteúdo programático para a educação escolar em saúde, é a relação da condição de saúde e a mortalidade. Todas as pessoas, em algum momento da vida, alcançarão ou serão alcançados pela morte biológica. Isso parece ser verdade, deixando quase nenhuma margem de contestação. Mas também obscurece o fato de as pessoas não terem a mesma idade quando isso acontece.
As taxas de mortalidade são efetivamente diferentes para diferentes grupos populacionais. Há grupos cujos indivíduos têm menos riscos de mortalidade e outros, têm mais fatores de proteção, portanto, ambos vivem mais. Tanto os fatores de risco, como os fatores de proteção são construídos ao longo da vida. Quanto mais cedo isso for aprendido e posto em ação, mais substanciais serão os seus resultados e, menos mortes precoces serão esperadas (Krohn et al., 2021).
Por outro lado, os fatores de risco à alta prevalência de doenças em crianças, como o nascimento de gestações desfavoráveis, condições de pobreza, subnutrição, habitação inadequada, rupturas familiares, ausência de educação, abuso e violência e o fato de viverem em situações econômicas adversas, são situações de maior chance de apresentar problemas no crescimento e desenvolvimento, aos quais estão expostas muitas crianças brasileiras (Zamberlan, Biasoli-Alves, 1996; Halpern et al., 2000).
Esses fatores expõem a necessidade de abarcar a problemática de modo mais abrangente, como um processo complexo e multifacetado, onde sistemas interdependentes (família, grupos, comunidade e sociedade em geral) são influenciadores do processo de desenvolvimento e requerem a compreensão de suas diversas formas de interações com o ambiente em seus vários contextos. Há que superar a visão limitada sobre fatores de risco, muitas vezes focada nas condições médicas do sujeito, como algo do indivíduo, bem como seu desvio no desenvolvimento, para alcançar uma abordagem que considere a sua interdependência entre o individual e o contexto ambiental, tratando-se de uma transação entre o individual e o ambiental (Buss, 2000; Molinari, Silva e Crepaldi (2005).
Delimitando a discussão da educação escolar em saúde, percebe-se a necessidade de atendimento de alguns objetivos estruturantes da formação curricular, como: experienciar variadas formas de movimentos e habilidades básicas, entendendo as repercussões dessas atividades em um corpo que cresce e se desenvolve; se capacitar para identificar problemas de saúde no cotidiano e elaborar métodos e atividades para resolvê-los; identificar problemas relacionados à falta de atividade física regular e alimentação e nutrição balanceada, elaborando propostas resolutivas de enfrentamento, criando ambientes que deem suporte a isso acontecer; filtrar a adequação da informação, diante o aumento de informações imprecisas, às vezes, deliberadamente enganosas, exigindo diferentes habilidades pessoais para avaliar a relevância e a confiabilidade das informações sobre a saúde; entre outros numerosos desafios (Silva et al., 2021).
Espera-se que a educação em saúde no âmbito escolar, possa ensinar os conhecimentos e habilidades básicos de saúde, aprimorando os conteúdos programáticos e curriculares das disciplinas escolares, para a perspectiva de agir altruisticamente em um cenário, cujos acontecimentos se inter-relacionem para a manutenção, promoção e recuperação da própria saúde e daqueles em seu entorno.
Os processos formativos que as intervenções no âmbito de programas voltados à promoção da saúde na escola, geralmente centrados na atenção, na prevenção ou no manejo de comportamentos de risco, a partir de processos informativos, replicando o modelo recorrente em outras esferas da saúde pública. Tal modelo de prática se mostra pouco efetivo e precisa ser superado por um modelo formativo que visa a superar práticas educativas que se restringem à intervenção sobre os hábitos e estilos de vida individuais e que integre a prevenção e o cuidado clínico individual com ações multissetoriais (governo, sociedade civil, familiares, alunos, professores e profissionais da saúde) que aumentem os fatores ambientais de proteção à saúde (Machado et al., 2015; Lopes, Nogueira e Rocha, 2022).
Nos conteúdos voltados à saúde mental, por exemplo, os alunos lidam com a ansiedade e as preocupações por meio de diferentes atividades, como exemplo, as atividades físicas (AF) de lazer, recreação, de condicionamento físico-funcional, exercícios respiratórios, de relaxamento corporal, etc., cujo significado e necessidade são desenvolvidos nas aulas de educação física, onde se explora os domínios da saúde, nos diferentes domínios da atividade física (lazer, deslocamento ativo, trabalho laboral e no lar), articulados com fatores do ambiente, na superação das vulnerabilidades enfrentadas (Lima, Piovani e Lima, 2018; Hahn et al., 2021).
Assim, como estratégias para diminuir fatores de vulnerabilidade e aumentar os fatores de proteção à saúde, sugere-se a relação vez mais horizontal e aproximada entre educação, setores da saúde e demais agentes da sociedade, como estratégias para diminuir fatores de vulnerabilidade e aumentar os fatores de proteção à saúde para subsidiar crianças e adolescentes na adoção de comportamentos saudáveis, desassociando-os da esfera do comportamento ou conhecimento saudável individual (Lopes, Nogueira e Rocha, 2022).
3.1. Estratégias para enfrentar o problema
Nessa perspectiva, e na necessária articulação multidisciplinar, parece importante conhecer as formas como cada área temática se apresentada e se relaciona com o ensino, onde as características de cada área formam o núcleo comum de significados essenciais do aprendizado, como é vinculado à aprendizagem de conhecimentos e habilidades de novas demandas de saúde que acompanham as mudanças na sociedade, ensinando e permitindo aos alunos aprenderem sobre a estreita conexão da AF com hábitos saudáveis de vida, ampliando e dando-lhes a ideia concreta da relação da AF com a saúde.
Desse modo, com base em situações da vida cotidiana, nas características das disciplinas e norteados pelo núcleo de alfabetização, integrar a educação em saúde nos materiais curriculares na educação básica, parece ser uma medida importante para alcançar a multiplicidade e se afastar da normalização da aprendizagem. A heterogeneidade dos alunos, implica em confrontar a pedagogia escolar de produção de subjetividades em série e buscar a geração de diferentes possibilidades moldadas à necessidade de cada um, afastando-se do processo de sujeição a uma condição universal pré-determinada.
No momento, parecer não haver uma decisão finalizada sobre o melhor modo de efetivar, no âmbito escolar, a dinâmica da educação em saúde. No entanto, diante às inúmeras e respeitosas sugestões apresentadas na literatura, parece-nos que alguns pontos centrais deveriam fazer parte dos conteúdos programáticos das estratégias pedagógicas.
Diante isso, sem prejuízo aos diferentes estágios de crescimento e desenvolvimento de crianças e adolescentes, alguns elementos básicos, relativamente independentes, deveriam interagir entre si (Reed et al., 2014). A apresentação desses domínios norteadores fogem à pretensão de excluir demais possibilidades.
Os domínios, aqui relacionados, incluem domínio físico; mental e social, respectivamente: estilo de vida saudável e crescimento a desenvolvimento saudável; saúde mental; prevenção de doenças, segurança e prevenção de riscos. Estas sugestões endossam as diretrizes de várias organizações internacionais que já as puseram em prática e aguardam desfecho, nomeadamente, a Associação de Saúde Escolar do Japão (ASEJ, 2022). A síntese desta estrutura, com os respectivos subdomínios e justificativas, é mostrada no Quadro 1.
Quadro 1 Proposta de requisitos estruturantes para o suporte à educação escolar em saúde, no ensino básico.
Domínio | Subdomínios | Justificativa | |
---|---|---|---|
Físico | Estilo de vida saudável | Conceitos de saúde e doença; fatores de risco e de proteção à saúde e ao controle de doenças; higiene pessoal. | Muitas doenças surgem ou são agravadas por estilos de vida pouco saudáveis a longo prazo. |
Crescimento a desenvolvimento saudável | Aspectos físicos, funcionais e comportamentais na infância e na adolescência; saúde sexual; prevenção e busca de ajuda de abusos; valorização da vida. | A infância e a adolescência são períodos importantes e de vigorosas alterações no crescimento, no desenvolvimento e comportamentais dos indivíduos para transitarem com saúde para a idade adulta. | |
Mental | Saúde mental | Adaptação social; regulação emocional e comportamental; assistência aos transtornos psicológicos. | A saúde mental impacta a qualidade de vida da pessoa, os comportamentos ativos e reativos das emoções cotidianas, o modo de se relacionar socialmente e consigo mesma. |
Social | Prevenção de doenças | Conhecimento básico de doenças infecciosas e DCNT; prevenção e controle das doenças; impacto individual e social das doenças; sistema de saúde pública; resposta às emergências de saúde pública. | Crianças e adolescentes são suscetíveis às doenças infecciosas tradicionais e emergentes. As DCNT podem ser evitadas ou minimizadas com adoção precoce de cuidados. |
Segurança e prevenção de riscos | Habilidades de primeiros socorros; segurança de trânsito; ocupacional; social e da informação. | Lesões e ameaças de violência são os principais fatores que afetam a segurança de vida e a saúde de crianças e adolescentes. |
Fonte: Dados da pesquisa
A lógica interna dos domínios e subdomínios norteadores propostos para suportar os conteúdos programáticos na educação escolar em saúde, se sustenta na introdução de conhecimentos fundamentais de saúde, no treinamento de competências específicas e no desenvolvimento de habilidades, permitindo aos alunos serem orientados a compreender o conceito de saúde e a sua influência para a própria vida e da coletividade.
Nesse contexto, proporciona-se às crianças a oportunidade de adquirir conhecimentos fundamentais relacionados à prevenção de doenças comuns. Isso envolve compreender a importância de comportamentos saudáveis para a manutenção da saúde, como a prática regular de atividades físicas e o descanso adequado. Além disso, abrange a promoção de uma alimentação equilibrada e nutritiva, como medida preventiva contra o excesso de peso e a obesidade infantil. Também se estimula a incorporação de hábitos de higiene pessoais no cotidiano, bem como a compreensão do papel do controle social nas políticas de saúde pública. As crianças são incentivadas a estabelecer normas de autoproteção que valorizem a vida e adquiram habilidades para obter informações precisas por meio de fontes confiáveis, evitando fraudes em telecomunicações e redes. (ASEJ, 2022).
Tudo acontece considerando a desigualdade social como caraterística estrutural indicadora de distribuição desigual de oportunidades e recursos numa sociedade. A desigualdade ao acesso de informações de saúde de qualidade se apresenta como lacuna que tende a perpetuar as condições desiguais de saúde das pessoas e dos grupos sociais. No âmbito global, cresce progressivamente o interesse social em discutir a distribuição desigual dos problemas de saúde nas populações e, em compreender as causas dessas diferenças (Marmot e Bell, 2016).
No Brasil, houve aumento significativo nesse interesse a partir da década de 1980, sem, no entanto, ter alcançado uma forma óbvia de determinar com exatidão a pertença das pessoas a determinada classe (Silva, 2010). Desse modo, o entendimento de desigualdade de classe social neste ensaio, assume que a classificação social é uma tentativa de teorizar as diferenças dos acontecimentos que ocorrem em pessoas que vivem em condições sociais diferentes.
A falta de educação e alfabetização para a saúde, inteirada com determinada posição social, está consistentemente relacionada com o estado de saúde das pessoas, pois estes determinantes, ao longo da vida, estruturam as diferenças nos graus de vulnerabilidade às doenças e às suas consequências; na exposição aos riscos de saúde; na negligência aos fatores de proteção de doenças, que somados, potencializam fortemente a distribuição desigual da doença na sociedade. A ideia é que as nossas preferências e diferenças nos levam a escolher viver de formas diferentes e a estabelecer prioridades diferentes e, nesse sentido, tornamo-nos desiguais (Artzen et al., 2019).
Nem todas as diferenças de saúde entre diferentes grupos podem ser caracterizadas por desigualdade social. As variações no estado de saúde podem ser atribuídas a diferentes fenômenos, como o processo de envelhecimento, cujo risco de doença e morte aumenta com a idade, ou por comportamentos perigosos que aumentam os riscos à saúde, como a prática de atividades radicais de aventura ou, de determinadas profissões de maior periculosidade. As desigualdades na saúde que exploramos são aquelas diferenças de morbidade e mortalidade prematura, causadas por variáveis, as quais os indivíduos têm pouca ou nenhuma escolha (Johansson e Borander, 2004).
Ultrapassado o destaque da necessidade de abordagem da desigualdade social na formação educacional para a saúde das pessoas, também há lacuna processual de desigualdade no enfrentamento aos problemas de saúde nos diferentes sexos. Nos últimos anos, a importância dessas diferenças nas condições de vida das mulheres e dos homens tem sido cada vez mais reconhecida (Fukuda et al., 2022).
Muito embora as mulheres, de modo geral, apresentem maior longevidade do que os homens, em todas as idades, elas registam mais problemas de saúde, consomem mais medicamentos e têm mais óbitos por doenças. Para esclarecer o paradoxo desse fenômeno, os modelos explicativos biológicos parecem insuficientes, sugerindo a necessidade de introduzir outros fatores na discussão sobre as causas das diferenças de saúde, para a morbidade e mortalidade precoce entre homens e mulheres (Johansson e Borander (2004) e Hashmi e Anjum (2018).
Esse fenômeno confronta o desacertado protótipo de modelo social masculino, onde o corpo masculino é forte e, o corpo feminino, fraco. Reservando ao homem uma vida produtiva e à mulher, uma vida reprodutiva, expondo-a aos riscos aumentados de saúde, associados ao parto e, elegendo o modelo masculino como referência de normalidade. Esse modelo ultrapassado e equivocado, atrapalha o reconhecer de diferenças dos sexos em relação à saúde, às morbidades e à mortalidade precoce, deixando os homens expostos a adoecerem por complicações de doenças negligenciadas, fazendo-o crer, incorretamente, que a expressão de doença e o pedido de ajuda externa seja uma condição de fraqueza e vulnerabilidade (Johansson e Borander (2004); Zajakova e Lawrence, 2018).
Não se trata, aqui, reverter as condições de cuidados das mulheres a favor dos homens, com retirada de recursos de um a favor do outro. As condições de saúde devem alcançar todos. Uma sociedade é sadia na medida que cada um de seus membros também seja. Então, a educação para a saúde deve se debruçar para anular o equívoco, insistentemente recriado das distinções entre o que é considerado masculino ou feminino, associando o homem, à força e ao poder.
Este equívoco necessita ser suprimido na educação em saúde, para homens poderem remediar precocemente seus problemas de saúde. Esta condição pode ser de grande importância, tanto para melhorar as condições de vida pela ausência de doenças como pelo abrandamento de suas complicações.
Estudos mostram que existe uma relação clara entre o nível de instrução e a pertença ao grupo com maior quantidade e gravidade de doenças negligenciáveis. As pessoas com baixo nível de instrução são mais vulneráveis. Adoecem mais, sofrem mais por consequência de doenças evitáveis e, apresentam maior taxa de mortalidade precoce.
A mortalidade aumenta com a idade e os homens têm mais probabilidades de morrer do que as mulheres, em todos os grupos etários (Johansson e Borander (2004). Com o aumento dos níveis de instrução, a proporção de pessoas com elevadas taxas de doenças tende a diminuir. A educação parece ser um bom investimento para a saúde, principalmente entre os mais vulneráveis (Levèfre, 2004).
A exposição ao maior risco de mortalidade precoce dos homens é um fenômeno bem conhecido e, para o qual, são apontadas explicações biológicas e sociais. Assim, enquanto a diferença entre os sexos também expressa diferenças sociais, implicando em desigualdade na prevenção e enfrentamento dos riscos à saúde, em detrimento as homens.
Em particular, tal como acontece nas diferentes faixas etárias, importa ter em conta a distribuição dos agravos à saúde por sexo. Este achado esconde diferenças bastante significativas, não só entre homens e mulheres, mas também entre pessoas de diferentes classes sociais ou grupos educativos. Educação e classe social não são o mesmo, mas estão fortemente relacionadas.
Curiosamente, para cada nível de ensino, a mortalidade precoce diminui, de modo que, os que possuem o ensino fundamental, registram taxas de mortalidade mais elevada e, os pós-graduados registram taxas menores. Cada incremento adicional de escolaridade está associado a uma redução do risco de mortalidade. Assim, ter ensino universitário em vez de apenas a escolaridade obrigatória está associado a um menor risco de mortalidade precoce. Sejam quais forem os mecanismos que ligam o nível de instrução ao risco de mortalidade, é difícil imaginar a existência de uma variável mais forte de que o maior volume de educação (Chen et al., 2019).
4. CONCLUSÕES
Neste artigo, examinamos as perspectivas positivas da educação escolar em saúde e, a averiguação de lacunas presentes nesta área do conhecimento à espera de preenchimento. Secundariamente, propomos um esboço de domínios norteadores, capazes de suportar os conteúdos programáticos na educação escolar em saúde, para alunos do ensino básico. Destacamos que os fatores sociais contribuem para a distribuição desigual dos problemas de saúde na sociedade. A literatura mostra uma relação clara do maior grau de instrução escolar e sua consequente repercussão socioeconômico, como: melhores condições de trabalho, o rendimento, a riqueza e a habitação, na proteção às adversidades da saúde. A diferenciação biológica e comportamental entre os sexos constituem fatores de risco e causam diferenças nas taxas de doença e na morte precoce, em detrimento dos homens. Parece que entre as mulheres, a educação é um investimento na saúde, enquanto para os homens é mais incerto. Este fato resulta, em parte, das taxas de mortalidade mais baixas das mulheres. Os homens têm mais probabilidades de morrer precocemente em consequências de negligência à saúde, do que as mulheres em todos os grupos etários e também em todas as classes. Existem diferentes pontos de vista sobre as necessidades e oportunidades de alterar as condições que contribuem para a distribuição desigual dos problemas de saúde, no entanto, o papel promissor da educação para a saúde em prol da saúde e do bem-estar das pessoas, iniciada precocemente no âmbito escolar, encontra muito pouco espaço de contestação pelo meio acadêmico.